terça-feira, 16 de novembro de 2010

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"A Melhor Prova duma Real Amizade

A melhor prova duma real amizade está em evitar os compromissos entre aqueles que se estimam. Ainda que devendo muito aos que muito me louvam, eu não quero ser-lhes obrigada pela gratidão. Mas sim grata porque estou com eles, devido a circunstâncias que a todos nós agradam e são um laço mais entre nós, sem constituírem um dever. Eu pretendo dizer da amizade o que Diógenes dizia do dinheiro: que ele o reavia dos seus amigos, e não que o pedia. Pois aquilo que os outros têm pelo sentimento comum não se pede, é património comum. Neste caso, a amizade. "

Agustina Bessa-Luís, in 'Dicionário Imperfeito'


Hoje alguém me perguntou porque razão tinha terminado com uma amizade.

Esta questão fez-me voltar ao passado.

É que, há situações na nossa infância que indelevelmente nos marcam para o futuro.

Independentemente da nossa personalidade, a aculturação acaba por condicionar a nossa forma de estar, de viver e de sentir o mundo que nos rodeia.

E nos últimos dias tem vindo à minha memória uma situação que ocorreu quando tinha quatro anos.

Estava a brincar com uma das minhas irmãs no pátio da minha casa. Era uma manhã de Verão...

Como habitualmente, por volta das 10 horas da manhã, a leiteira aproximou-se do portão e exclamou: "- Oh de casa, é o leite fresquinho".

Enquanto ficou à espera que a minha mãe descesse as escadas com um fervedor onde colocava o leite, a leiteira virou-se para a minha irmã e perguntou se ela queria ia brincar para casa dela, ao que ela respondeu que sim. Impulsivamente, perguntei se também podia ir. A leiteira olhou para mim e disse: "- Não que tu és feia".

Recordo-me perfeitamente que na altura não fiquei magoada pelo facto de ela ter dito que eu era feia. Fiquei magoada pela rejeição. Naquela altura prometi a mim própria nunca mais me auto-convidar fosse para o que fosse e afastar-me quando sentisse que estava a mais.


Quando alguém que julgamos ser nosso(a) amigo(a) nos fala em sentimento de "dever" ou de "sacrifício", algo está mal. Na amizade não há "dever", nem "sacrifício". Há partilha de emoções, de afectos, de alegrias e tristezas. De risos e de lágrimas.  

Porque acabou a amizade? Porque até hoje tenho tentado cumprir a promessa feita com quatro anos de idade...
 
 



26 comentários:

Eu Mesma! disse...

Eu estou tao farta de justificar o terminar amizades....

as pessoas afastam-se... têm atitudes incorrectas...
nao sou eu que termino as amizades...
eu apenas opto por as não reatar quando a pessoa percebe que agiu mal...

isso é errado?

NI disse...

Eu Mesma, não tens que justificar o final de uma amizade a ninguém a não ser à outra parte se lhe interessar ouvir.

Os motivos só interessam às partes.

É claro que pode dar azo a comentários de outras pessoas que tentam adivinhar os verdadeiros motivos. Mas não me preocupo com tais comentários. Os veradeiros motivos só digo à pessoa em causa se ela quiser ouvir. Se não quiser ouvir, ficam comigo.

Francisco o Pensador disse...

Discordo.
Muitas vezes, certas atitudes incorrectas podem esconder uma intenção correcta. Só que infelizmente a maioria de nós nunca valoriza as intenções e concentra o seu julgamento apenas nas atitudes mostradas pelo "prevaricador".
Gostamos de acreditar que a amizade não acarreta um dever, uma obrigação, mas a verdade é que por vezes sentimo-nos incumbidos em fazê-lo ou, mais não seja, acabamos por fazê-lo inconscientemente.
Quem algum dia conseguirá quantificar a quantidade de amor existente numa amizade verdadeira?
Poderemos nós definir uma média?
Quanto devemos dar? Quanto devemos receber?
Quem poderá avaliar o seu real valor sem ser nas horas más?
E poderá ela se tornar tão forte na nossa vida ao ponto de um dia se tornar também assustadora?
Todas estas questões são legitimas, pensem nisso.
Por um amigo, que mais não seja, irei sempre sentir-me na obrigação de perdoar.

Porque errar sempre foi humano, sobretudo para quem nunca teve a oportunidade de perceber qual o verdadeiro significado de uma amizade.

Bjs nina

(Ps: E tu és LINDA NINA! LINDA! Cá para mim essa leiteira devia era andar com falta de....ai o que eu ia dizer..)

NI disse...

Francisco eu não disse que não se deve perdoar. Pelo contrário. Nem disse que uma atitude incorrecta conduz ao final da amizade. Aliás, se alguém entender dessa forma não sabe o que é a verdadeira amizade.

Agora, o que eu não concordo é que se diga que a amizade é um sacriício ou dever. Eu não quero qu ningém tenha que fazer um sacifício para ser meu amigo. Quero que os meus amigos tenham razer em partilhar comigo. E que tal não seja uma obrigação.

Nota - entendi a mensagem mas penso que estamos a falar de coisas diferentes. :)

Beijo

Tinta Permanente disse...

Mas uma amizade não significa também troca? Se a amiga não me procura, o que vou eu pensar? Em perdoá-la? Se não teve 5 min para ouvir um desabafo meu, em dois anos, eu vou ter uma tarde para o casamento dela? Há uma diferença em perdoar e ser otária, não ?
Em 2008, fiz uma limpeza de consciência e mandei três amigas e uma prima às couves! Eu sinceramente não tenho tempo para perder em mendigar amizade ou perdoar cretinices. Acho (e isto é para o Pensador) que temos de nos dar valor e pôr as pessoas no lugar! Com diz a Ni, a amizade é gratuita e não um frete.
E beijinhos a todos.

NI disse...

Tinta, utilizaste um termo que eu gostaria de ter utilizado: "mendigar". A amizade não se mendiga.

Quanto ao perdoar: Não sou ninguém para perdoar ou deixar de perdoar. Aliás, confesso que não gosto muito deste termo.

O que eu entendo, mal ou bem, é que desde que as situações e circunstâncias não coloquem em causa os pilares que eu considero fundamentais (lealdade, confiança e respeito), consigo esquecer algumas atitudes. Mas elas têm que ser explicadas, porque a amizade pressupõe partilha. E eu não posso entender aquilo que desconheço.

Beijos

Djinn disse...

Minha amiga sei perfeitamente o que isso é mas eu acho que de facto numa amizade bem como no amor não pode haver sacrifícios, nenhum de nós é perfeito e concerteza já cometemos erros junto dos nossos amigos, mas amigo é aquele que apesar dos nosso defeitos está lá para nós incondicionalmente, mesmo que de vez em quando nos dê na cabeça e nós a eles.

No entanto e já falei nisto algo é fundamental, o respeito e a reciprocidade pelo outro sem isto nenhuma relação pode perdurar.
E o que eu vejo é que existem relações de amizade e amor ou não existe uma ponta de respeito pelo outro logo não existe amizade.

Chamem-me radical, antiquada, o que entenderem, mas eu pauto a minha vida por valores que considero inalienáveis e tento viver de acordo com eles o mais possível, relevando as minhas falhas enquanto ser humano, mas respeito as pessoas em geral e os amigos e companheiros em particular, dou sem esperar retribuição, mas entendo que a ausência da mesma espelha os sentimentos ou a falta deles por parte do outro.

É a minha opinião e vale o que vale, mas vivo a minha vida de acordo com estes parâmetros e prefiro estar só que mal acompanhada...

Francisco o Pensador disse...

Tinta, entendo o teu ponto de vista mas ainda assim não posso deixar de me questionar.
Dizes que devemos nos dar valor (concordo) e colocar as pessoas no seu lugar, mas gostaria que me dissesses qual o lugar que entendes ser legitimo atribuír ás pessoas dentro de uma relação de amizade?
Se tiveres que colocar um amigo no seu lugar, estarás tu por tua vez a ser amigo dele?
E se a amizade é realmente gratuita, porque pretendemos nós receber algo em troca ou cobrar por ela?
Será que o facto de sermos o melhor amigo de alguém vai fazer com que ele também sinta a obrigação de ser o nosso melhor amigo?

É certo que ninguém gosta de passar longo periodos sem ter noticias dos seus amigos, mas nunca podemos esquecer o facto de que todos eles (ou a maioria) levam uma vida bipolarizada e não podemos por isso exigir que eles assinem um termo de exclusividade connosco.

Posso ser diferente da maioria das pessoas na forma como sinto e penso as coisas, mas, para mim...um amigo que não dá notícias durante 2 anos e findo esse tempo vem-me procurar, revela-me acima de tudo que mantém um interesse genuino pela minha pessoa, e por isso, poderá não ser considerado o melhor dos amigos....mas será indiscutivelmente um amigo verdadeiro.

Pelo menos é assim que eu penso.

Bjs

Francisco o Pensador disse...

Nina, agora que tive a oportunidade de analisar melhor o sentido da tua mensagem, parece-me de facto que levei as coisas para outro campo.
Peço-te desculpas.

:)

NI disse...

Djinn, subscrevo as tuas palavras.

Francisco, ao dizeres "poderá não ser considerado o melhor dos amigos....mas será indiscutivelmente um amigo verdadeiro", estás a admitir vários "graus de amizade". É possível. Aliás, já fiz um post há pouco tempo em que muitos defendiam vários "tipos de amizade". Para mim há os conhecidos e os amigos. Mas não é menos verdade que tenho uma ou duas pessoas que não consigo enquadrar como simples conhecidos mas que também não posso chamar de amigos na verdadeira acepção do termo.


Beijo

Nota - adoro qundo me pedes desculpa, só não sei é porquê, ahahahahahah

Tinta Permanente disse...

Pensador, apenas o facto de me estares a prestar atenção é um pequeno sinal de amizade. Nem isso eu tive da tal minha amiga que nem atendia os meus telefonemas nem ligava de volta. Quando, por razões que desconheço, me ignora, que legitimidade tem uma amizade, agora pergunto eu? Terá sido por eu a presentar um amigo meu, com quem ela acabou por casar, e já não ter tempo para a nossa amizade? Tens razão, não podemos cobrar. Era uma amiga de quem sinto a falta, que me iluminava ao falar. Mas tens razão na parte da exclusividade. Quem sou eu para reclamar seja o que for? Temos de saber viver também com a rejeição.

Francisco o Pensador disse...

Tinta, é precisamente esse o ponto onde pretendia chegar.
Porquê interpretar um possível sinal de indiferença como um sinal de rejeição?
Se ela conheceu um amigo através de ti, por quem ela se apaixonou e veio a casar mais tarde, não poderá esse "amigo" ter invadido cada pequeno recanto da sua alma, não deixando por isso uma réstia que seja de espaço para mais ninguém?
Se já estivestes apaixonada por alguém na tua vida, deves conseguir compreender isso melhor do que ninguém.
Uma paixão pode deixar uma pessoa de tal forma ligada à pessoa amada, envolvida nos seus sentimentos, absorvida pela intensidade do amor que sente, que nem consegue arranjar tempo ou motivação suficiente para pensar nas pessoas que outrora eram prioritárias mas que por força desse amor, passaram a ter uma importância secundária..

É brutal, eu sei, mas quem pode condenar um amigo por se sentir feliz nas mãos de outra pessoa?

Tinta, se sentes falta dessa pessoa, é porque ela foi responsável por uma boa quota de felicidade que sentistes na tua vida.
Não digo que devas continuar a gostar dela, mas uma vez que ela não te fez mal nenhum - exceptuando o facto de ter ignorado as tuas tentativas de contacto- será que essa pessoa não merece ainda assim o teu respeito por tudo o que ela te fez sentir, sorrir, rir ou até amar...no passado?

Pensa nisso.

Bjs

NI disse...

Vou intrometer-me no diálogo entre a Tinta e o Francisco para dizer o seguinte: compreendo ambas as posições. Ambos apresentam argumentos razoáveis. Concordo com uns e discordo de outros.

Mas tenho que salientar um dos argumentos porque esse sempre "mexeu" com o meu "eu": Francisco, para mim INDIFERENÇA È REJEIÇÃO.

Eu seu que vais dizer que tenho uma incapacidade de lidar coma indiferença. Eu respondo que sim. Sempre o assumi. Mas ninguém me consegue convencer que indiferença não é rejeição. E quando se ama (e tu defendes que a amizade é uma forma de amar), tem-se sempre espaço e tempo para demonstrar isso. Nem que seja com um simples "olá, como estás". Somos seres sociais. Todos nós precisámos de saber que alguém pensa em nós, nem que seja de "vem em quando"...

Beijo

Francisco o Pensador disse...

Nina,
A Indiferença é um sentimento ligado ao amor enquanto que a Rejeição está ligada ao ódio, logo, são 2 sentimentos bem distintos que jamais poderão ser ligados um ao outro.

A Rejeição será talvez o pior dos sentimentos que o ser humano pode experimentar ao longo da sua vida. Sei do que falo porque também já a senti na pele e sobrevivi (e hoje até lhe acho alguma piada).
A Rejeição é cruel, é repulsa, é nojo, é a intrínseca não-aceitação do "outro".

Mas...e a indiferença?
Quando ela provém daqueles que amamos mais na vida, ela torna-se talvez na dor mais aguda que um coração pode sentir.
O amor não consegue garantir a reciprocidade de sentimentos e torna-se extremamente doloroso quando se começa/continua a amar/gostar de alguém e tudo o que se recebe de volta é um silêncio frio, indiferente, cruel...
E já por isso a indiferença é encarada como um teste, como...o maior desafio que se pode colocar ao amor, nina!
Não há amor recebido que consiga produzir o mesmo efeito de um amor dado e é através da indiferença que conseguimos ficar consciente do "verdadeiro" amor que sentimos dentro de nós.
Iremos crescer como pessoas, e por isso, o que aparentemente pode ser encarado como uma perda...é na realidade um ganho.


"O amor tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais acaba."

Já não sei quem escreveu isso, mas sei que fala da indiferença nas suas entrelinhas...

Bjs

NI disse...

Francisco, já falámos os dois sobre este tema inúmeras vezes e apesar de aprsentares argumentos válidos, continuo a pensar que a indiferença não está ligada ao ódio.

Para mim, a indiferença pode ser a a arma mais poderosa para se magoar alguém e não é preciso odiar. Muitas vezes até é a forma que usamos para magoar quem gostámos.

Mas é a minha opinião.

Beijo

Francisco o Pensador disse...

Nina, creio ter havido um possível pequeno engano na estruturação da tua frase.
Continuas a pensar que a indiferença não está ligada ao ódio....ou querias dizer ao amor?

Bjs

NI disse...

Não há erro de estruturação. Para mim, a indiferença não está ligada ao ódio mas ao amor.

Pelo menos foi sempre isso que eu senti. Só me abala a indiferença daqueles de quem gosto. Pelo que só senti a indiferença daquelas pessoas que dizem que gostam de mim.

Será que elas me odeiam? Tenho a certeza que não...

Francisco o Pensador disse...

Nina, mas o facto de considerar a indiferença como um sentimento ligado ao amor, não foi também aquilo que afirmei no meu comentário?

Disse: "A Indiferença é um sentimento ligado ao amor enquanto que a Rejeição está ligada ao ódio.."

E Ni, a indiferença é apenas um traço revelador da falta de interresse, nunca poderia ser considerada como uma arma para ser usada de forma maléfica, porque para ser feito nesses moldes, isso revelaria um interresse assumido (para o mal neste caso) e não uma "falta de", deixando por isso de poder ser considerada uma simples indiferença.

Acho que aquilo que tentas descrever é desprezo, ódio, desrespeito ou antipatia...e não indiferença.

NI disse...

Exacto. Só que,para mim, a indiferença é apenas uma das formas pelas quais pode revestir a rejeição.

Nota - Apesar de estar completamente em baixo, não me apanhas nas curvas :)

Francisco o Pensador disse...

Apanhei-te na mesma...hehehehe...porque "revestir a rejeição", embora possa nos parecer semelhante, a verdade é que está longe de ser o mesmo que "Indiferença é Rejeição" prontamente afirmado por ti no início.

Bjs nina

:P

(Ps: Percebestes o simbolo? Tirei a lingua...hehehehe)

NI disse...

Não Francisco.

Para mim indiferença é igual a rejeiçã. Ou, se quiseres de outra forma: sinto a indiferença como se de uma rejeição se tratasse.

Para mim é a mesma coisa porque sinto-a da mesma forma.

Bj

Francisco o Pensador disse...

Bom...vamos tentar outra abordagem.
Quando se trata de uma rejeição é fácil, mas de que forma consegues ficar consciente de que enfrentas uma indiferença?

Que eu saiba, além da indiferença um silêncio pode também revestir mil outros motivos ou razões...

Bj

NI disse...

Sabes que dou sempre o benefício da dúvida.

Mas, não é menos verdade, não tenho o poder de ver o que vai na mente das pessoas.

Tenho alguma sensibilidade e confio nas pessoas até ao limite. Apenas isso.

Mas na perpectiva que apresentas também nos podemos questionar porque razão as pessoas não confiam uma nas outras para que não se criem suspeições que muitas vezes não correspondem à verdade.

:)

Francisco o Pensador disse...

Precisamente Nina, agora tocastes bem em cheio no ponto.

Quando as pessoas "confiam" de facto umas nas outras...as "suspeições que muitas vezes não correspondem à verdade" jamais ganham a possibilidade de vingar...

:)

Nina, acho que te compreendi.
O que te magoa mais não é a indiferença em si (conceito demasiado gazoso para se conseguir atribuir-lhe uma forma), é sobretudo o vazio de afectos e de calor humano - principais alimentadores da tua alma - criado pela ausência...

NI disse...

O conceito "gazoso" tem direitos de autor.

:)

Estás a ver como chegaste lá? Custou...

Ahahahahahah

Tinta Permanente disse...

Percebo que haja um diferença entre indiferença e rejeição. Há muitas pessoas que usam a indiferença/ silêncio para esconderem rejeição. Por uma questão de cobardia, talvez. Pessoas que olham de frente, são raras. Até são tomadas por inconvenientes/ inoportudas. Quem quizer rejeitar alguém, como é que faz? Diz-lhe na cara, ou pelo contrário, esconde-se?
Para mim a indiferença pode ser um instrumento que fazer passar a rejeição.
A indiferença a meu ver não tem nada a ver nem com amor, nem com ódio. É uma arma insípida, pálida, amorfa e apática, parente do Niilismo.

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