Vamos ser claros:
Na sociedade actual existe um novo conceito de
beleza: uma mulher para ser bonita tem que ser magra. Só assim é aceite
socialmente.
Mas se aceitarmos que a magreza é condição
“sine qua non” para se ser aceite socialmente, chegamos, inevitavelmente, a uma
outra constatação: todas aquelas que não são magras são feias, logo,
excluídas.
Joana Novaes, psicóloga do Núcleo de Doenças da Beleza do Centro de Investigação e Atendimento Psicológico da Universidade Católica do Rio de Janeiro, numa reportagem
no”Notícias Magazine” de 14.10.2007 sob o título “Ser Mulher, ser feia, ser excluída”, afirmou: "...a gordura é uma das atribuições mais
representativas de feiura na cultura actual...ser feia é uma das mais penosas
formas de exclusão social. E ser feia é não ter o corpo e a estética socialmente
aceites, ou seja, ser magra, jovem e saudável...”. Acrescenta a autora: “É o difícil peso da
gordura, a dor da feiura”.
No referido artigo, são apresentados dois
grupos de “gordos”: o grupo dos “obesos benignos” e os “obesos malignos”. O
primeiro grupo é constituído pelas gordas bem dispostas que “parecem querer
desculpar-se da inadequação física através de uma convivência social agradável”,
são as denominadas gordas toleradas. No segundo grupo teremos aquelas que não se
preocupam em agradar e a consequência é serem imediatamente excluídas.
Devo confessar: tenho 10 quilos acima do peso
que é recomendado para a minha altura e para a minha idade. Mas este “acréscimo”
sempre me “perseguiu" desde pequena. Cresci acompanhada por esses magníficos
epítetos que as crianças (as tais que nunca têm maldade), são peritas em dizer:
“lá vem a baleia”, “lá vem a balofa”.
Assumo: sempre tive complexos de inferioridade
pelo facto de ser “gorda”. Talvez não os tivesse se vivesse no século XIX pois
seria considerada uma mulher formosa.
Com o tempo fui percebendo que apesar de ter
outro tipo de atributos os mesmos não eram suficientes para colmatar o “defeito”
de ser gorda. E, ainda hoje, é assim. Quer se queira, quer não, o nosso corpo é
o nosso cartão de visita.
Mas, interiormente, sempre me recusei a ser excluída.
Optei, então, por pertencer ao “grupo das gordas benignas”, começando por gozar
com o meu próprio “defeito”. Quando era “brindada com aqueles epítetos,
respondia: “não faz mal, o homem tem mais que apalpar”. Umas vezes ganhava a
batalha (principalmente quando respondia aos rapazes, dado que na flor da
adolescência começavam a pensar se não estariam a perder uma grande
oportunidade). Mas com as raparigas (ai essa eterna vontade de sermos as nossas
próprias inimigas, sempre prontas a humilhar a mais próxima não vá ser uma
oponente forte numa competição estéril), ainda era mais
gozada.
Mas a
idade também ajuda a lidar com estas situações.
Hoje em dia, já consigo brincar com a empregada
de uma loja quando pretendo vestir uma saia que fica entalada na anca, dizendo
que a costureira se enganou a cortar o tecido.
Mas em pleno século XXI, e após 47 anos de idade, a vida ensinou-me que Jean Paulhan tinha boas intenções quando escreveu:
"Pode-se amar
até a loucura uma mulher feia,
por encantos que superam os encantos da beleza".
Mas o estigma prevalece.