Dirigiu-se a mim a passos firmes e confiantes, apesar do peso que carregava na mão.
Recordo-me, sobretudo, dos seus enormes e expressivos olhos verdes e da sua cabeça alva.
Mas, sobretudo, recordo-me daquele sorriso...
Era um sorriso que iluminava aquele corredor frio e escuro enquanto aguardava notícias.
Olhou para mim e perguntou-me porque estava triste. Não me deixou responder na sua traquinice habitual.
- Vou-te contar uma história, disse ele. Aqui, continuou, quando alguém está triste contámos histórias.
Durante largos minutos, vagueámos num país longínquo onde um pequeno dragão gostava de andar às escondidas e de saltar à corda com os meninos de uma pequena aldeia e que um belo dia encontrou um pote de ouro por baixo do arco-íris.
Durante aqueles minutos era eu e ele. Unidos numa cumplicidade estranha que me fez esquecer a angústia da espera e me fez partilhar gargalhadas felizes.
Entretanto, vieram buscá-lo. Estava na hora da medicação.
Virou-se para mim e perguntou: Estás feliz agora?
Respondi que sim. Então, rodeou-me o pescoço com o braço que tinha livre e deu-me um beijo na cara, segredando-me ao ouvido - Ainda bem.
No dia seguinte, depois de visitar o meu pai, fui até à ala de pediatria do IPO procurá-lo. Levava um livro para colorir e lápis com as cores do arco-íris.
Não o vi e perguntei por ele a uma das enfermeiras. Respondeu-me que tinha falecido durante a noite.
Foi há 22 anos mas nunca me esqueci daquela criança de seis anos que teve a magia de me fazer feliz.
O seu nome? João.
7 comentários:
Caraças Ni... fizeste-me sorrir e chorar ao mesmo tempo... obrigada por teres partilhado essa história...
Bjo gde
Querida Gugui, decidi partilhar não com o intuito de colocar um post lamechas porque o João não merecia isso.
Ele teve o condão de espalhar felicidade por todos os que tiveram o privilégio de conviver com ele. E é isso que quero realçar.
Beijo
"Ele teve o condão de espalhar felicidade por todos os que tiveram o privilégio de conviver com ele."
Se um dia disserem isso de mim, já valeu a pena viver.
Concordo contigo Abobrinha. Aquela criança com apenas seis anos conseguiu o que muitos de nós, por mais anos que andemos cá, não conseguimos.
Ni,
Não achei a história lamechas, muito pelo contrário, é de uma beleza extrema... simplesmente me fez lembrar uma história parecida...
Estava do outro lado e resolvi passar por aqui para te deixar um bjinho.
Gugui, eu entendi. :-)
Teresa, sei que estou em falta contigo.
Um grande beijo para ambas
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