Clarice Lispector escreveu:
"Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso.
Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro."
Há muitos anos atrás, o meu pai disse-me que o meu pior defeito era ter um sentido de justiça muito elevado.
Respondi que não existia sentido de justiça elevado ou baixo. Ou existe justiça, ou não existe.
Ele olhou para mim e disse:
- "Tens toda a razão. Então dir-te-ei que no futuro terás muitas desilusões e irás perder bastante com a defesa intransigente que fazes da justiça. É uma virtude que na sociedade actual se transforma facilmente num defeito."
Sempre ouvi atentamente o que o meu pai dizia. Tal não significa que seguisse sempre os seus conselhos. Nem podia. O meu pai sempre me ensinou a aprender e a tirar as minhas próprias conclusões. Ele costumava dizer que as melhores lições de vida eram aquelas que acabavam sempre com uma valente "testada" na parede, acompanhada da frase "que grande burro(a) que fui".
Detesto dizer que o meu pai tinha razão. O meu maior defeito é ser intransigente quanto a injustiças porque, na maioria das vezes, resultam de um planeamento criterioso e com um propósito definido que resulta sempre no benefício de alguém em detrimento de outrém.
Mas também sei que não seria quem sou se fosse de outra forma. Nem que todos os dias tenha que bater com a testa na parede e dizer alto e bom som "que burra que sou". Mas é curioso que é, precisamente, este meu defeito que me faz sempre levantar do chão e continuar em frente.
Portanto, no meu caso, mesmo que o desejasse, e não desejo, não posso "cortar" o meu defeito sob pena de me "estatelar" no chão e o meu "edifício" ruir por inteiro. E ele deu muito trabalho a construir...
3 comentários:
Ainda que saibamos que nem sempre quem somos nos torna a vida mais fácil... como deixar de sermos quem somos...
TM, mas é uma "chatice" termos consciência de que não vamos a lado nenhum quando colocamos os valores e os princípios em primeiro lugar e os outros...bom, os outros conseguem tudo!
:)
Bolas, quando eu estava no ensino, era remar contra a maré todos os santos dias!
Confesso que por uma vez deveria ter participado à justiça e não o fiz, com receio de consequências. Por outro lado, (sem querer ofender) não tive esperanças na justiça...
Enviar um comentário