quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

O pequeno dragão e o arco-íris


Dirigiu-se a mim a passos firmes e confiantes, apesar do peso que carregava na mão.


Recordo-me, sobretudo, dos seus enormes e expressivos olhos verdes e da sua cabeça alva.

Mas, sobretudo, recordo-me daquele sorriso...


Era um sorriso que iluminava aquele corredor frio e escuro enquanto aguardava notícias.


Olhou para mim e perguntou-me porque estava triste. Não me deixou responder na sua traquinice habitual.


- Vou-te contar uma história, disse ele. Aqui, continuou, quando alguém está triste contámos histórias.


Durante largos minutos, vagueámos num país longínquo onde um pequeno dragão gostava de andar às escondidas e de saltar à corda com os meninos de uma pequena aldeia e que um belo dia encontrou um pote de ouro por baixo do arco-íris.


Durante aqueles minutos era eu e ele. Unidos numa cumplicidade estranha que me fez esquecer a angústia da espera e me fez partilhar gargalhadas felizes.


Entretanto, vieram buscá-lo. Estava na hora da medicação.


Virou-se para mim e perguntou: Estás feliz agora?


Respondi que sim. Então, rodeou-me o pescoço com o braço que tinha livre e deu-me um beijo na cara, segredando-me ao ouvido - Ainda bem.


No dia seguinte, depois de visitar o meu pai, fui até à ala de pediatria do IPO procurá-lo. Levava um livro para colorir e lápis com as cores do arco-íris.


Não o vi e perguntei por ele a uma das enfermeiras. Respondeu-me que tinha falecido durante a noite.


Foi há 22 anos mas nunca me esqueci daquela criança de seis anos que teve a magia de me fazer feliz.


O seu nome? João.



Nota - Quem puder, ajude a "Acreditar", associação de pais e amigos de crianças com cancro.


7 comentários:

Gugui disse...

Caraças Ni... fizeste-me sorrir e chorar ao mesmo tempo... obrigada por teres partilhado essa história...

Bjo gde

NI disse...

Querida Gugui, decidi partilhar não com o intuito de colocar um post lamechas porque o João não merecia isso.

Ele teve o condão de espalhar felicidade por todos os que tiveram o privilégio de conviver com ele. E é isso que quero realçar.

Beijo

Abobrinha disse...

"Ele teve o condão de espalhar felicidade por todos os que tiveram o privilégio de conviver com ele."

Se um dia disserem isso de mim, já valeu a pena viver.

NI disse...

Concordo contigo Abobrinha. Aquela criança com apenas seis anos conseguiu o que muitos de nós, por mais anos que andemos cá, não conseguimos.

Gugui disse...

Ni,

Não achei a história lamechas, muito pelo contrário, é de uma beleza extrema... simplesmente me fez lembrar uma história parecida...

*tεrεsα* disse...

Estava do outro lado e resolvi passar por aqui para te deixar um bjinho.

NI disse...

Gugui, eu entendi. :-)

Teresa, sei que estou em falta contigo.

Um grande beijo para ambas

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Porque não defendo:guetos, delatores pidescos, fundamentalismos e desobediência civil. Porque defendo o bom senso